Nunca tive vocação pra dividir minha vida nem meu espaço, mas demorei quase quarenta anos pra aceitar esse fato.
Quatro casamentos depois, não tenho mais dúvidas de que o egoísmo que me acusavam nada mais era que um anseio imparável da alma pelo silêncio e, porque não, pela solidão.
Desde muito pequena tinha verdadeiro fascínio pelo meu quarto. O parquinho não me interessava, as crianças não me despertavam, ir a escola era um martírio… poderia passar dias e dias trancada em meu quarto, rodeada de livros e lápis de cor, brincando sozinha, imersa em um mundo inalcançável, criado por mim, para mim.
Mamãe fazia de tudo pra me empurrar pra fora, me obrigava ir andar de bicicleta no Ibirapuera, ligava para a vizinha me chamar pra brincar lá em baixo. Chorava, não queria sair do quarto, não queria falar com as pessoas, não queria ver o sol. E mais que tudo, odiava ir ao Ibirapuera aos domingos!
Depois, veio o Amor, o Blues, o Sexo, mais tarde a Poesia, a Filosofia, a Literatura e a Arte.
Aí então fui descobrindo que o mundo lá fora era lindo, e como eu, existiam milhões de pessoas desacomodadas nesse planeta. Só que isso levou uns 20 anos!
Hoje, na hipotética metade da minha existência, retomo o espaço secreto de que fui privada na primeira parte de minha vida, e volto a mergulhar fascinada no meu mundo… no meu quarto colorido, de livros discos, pincéis e luzes.. impenetrável, inconstante, impossível de partilhar, não importa quantos sejam os amores que eu venha viver.
E agora, protegida por essas paredes, só me vem a mente aquela passagem em que Albert Camus confessa sobre si «E eu nunca me senti tão imerso e ao mesmo tempo tão desapegado de mim e tão presente no mundo» y es así 😜
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